Se resiliência é uma palavra em voga ultimamente, este grupo paulistano sabe bem qual é o seu significado…

Trayce | Foto: Filipe Nevares

A trajetória do Trayce, que completa dez anos de atividades, é marcada por diversas mudanças. Nada, no entanto, foi capaz de brecar o ímpeto do grupo paulistano de metalcore, que atualmente promove o terceiro álbum, “Miragem”. Surgida em 2007 como Ace 4 Trays e lançando o primeiro álbum, “Roll The Dice”, em 2009, a banda foi obrigada a alterar o nome para Trayce por questões jurídicas. Veio o álbum “Bittersweet” (2011), seguido por alterações na formação, até que chegaram ao time que gravou “Miragem”, com Raphael Castejon (vocal), Alex Gizzi (guitarra), Fabricio Modesto (guitarra e vocal), Rafa P.Ciano (baixo) e Cadu Gomes (bateria). A seguir, Gizzi e Castejon falam sobre a concepção do mais recente lançamento.

Primeiro foi a mudança de nome, depois a formação, o idioma das letras e parte da musicalidade. Não ter medo de arriscar foi uma das características que levou o Trayce do single “Corpo Fechado” (2014) até o novo álbum? Como foi a concepção de “Miragem”, que levou dois anos para ser finalizado?
Alex Gizzi: Com certeza, nós nunca pusemos nenhum tipo de barreira quando compomos. As músicas do “Miragem” nasceram naturalmente. Praticamente nos encontrávamos todos os finais de semana e sempre chegávamos com alguma ideia. Fizemos diversas músicas e fomos lapidando até chegar ao que consideramos como ‘o algo novo’. “Miragem” soa como Trayce, mas tem algo diferente ali. Exploramos muitos efeitos e outros instrumentos da nossa cultura, e, na parte lírica, pensamos em cada detalhe de cada frase, pois escrever em português e conseguir passar a nossa mensagem de uma forma que não soasse ‘mais do mesmo’ foi o grande desafio.

Raphael Castejon | Foto: Jéssica Alves

Utilizamos a viola caipira e o atabaque na música ‘Queda Livre’, sintetizadores em quase todas e também inserimos o rap em ‘Réus’ com participação do Dj Caique” – Raphael Castejon

Estas inovações em relação aos trabalhos anteriores se dão pelo uso de viola caipira e atabaques, além de sintetizadores e efeitos, que conectam ao djent. Isto foi elaborado na criação das músicas ou teve a mão do produtor Wagner Meirinho, da produtora Loud Factory?
Raphael Castejon: Bom, a cada dia novos discos são lançados e, na maioria dos álbuns, nacionais ou internacionais, nota-se um aprimoramento ou exploração de novos recursos nas músicas, porque diversas bandas estão buscando se reinventar a todo momento. No “Miragem” não foi diferente, resolvemos testar e explorar as nossas raízes, utilizamos a viola caipira e o atabaque na música “Queda Livre”, sintetizadores em quase todas e também inserimos o rap em “Réus” com participação do Dj Caique. Estas propostas partiram da banda, mas tivemos um grande apoio e direcionamento de Wagner Meirinho, que sempre deixou claro para nós que devíamos ousar e levar coisas novas para o estúdio.

O quanto o trabalho do Trayce com produtores como Adair Daufembach e Wagner Meirinho ajudou no produto final entregado pela banda em seus lançamentos?
Gizzi: Trabalhar com ambos nos trouxe muito aprendizado e experiência. Ambos são grandes produtores do nosso país e, com certeza absoluta, contribuíram muito para o produto final.

Baseando-se no conceito das letras do álbum, “miragem” seria a sensação de ter alcançado sucesso na vida, ainda que passando por cima de todos a qualquer custo? O vazio demonstrado na arte de capa passa a mensagem implícita na ideia central?
Castejon: Sim, a arte do disco reflete bem o conceito da obra em si. Em um breve resumo sobre a capa, seria o controle do poder, da verdade. Observando os elementos, uma moldura de ouro no meio do vazio, delimitando a luz, no qual esta simboliza a verdade, o sentido da vida. O ambiente é escuro, lembra uma sala de um grande líder. Quando divulgamos a arte, recebemos diversas interpretações, “luz no fim do túnel”, “controle das almas”, entre outras. O que nos deixou muito felizes, pois era esse o nosso propósito, gerar uma mensagem subliminar que fosse interpretada de acordo com a percepção de cada fã, levantamos a bandeira do autoquestionamento. O conceito central de “Miragem” é falar sobre o falso sonho americano, onde as pessoas acreditam que para serem felizes precisam ter posses e bens materiais. Algumas ficam “cegas” durante o caminho para chegar ao tão sonhado “topo” e passam por cima umas das outras, alimentando egos e vivendo uma vida de mentiras. As letras mostram uma perspectiva de fora da situação, não usamos uma linguagem de autoajuda. Apertamos a ferida e deixamos que cada um interprete como bem desejar, de acordo com a sua realidade.

Capa do álbum "Miragem", do Trayce

Uma moldura de ouro no meio do vazio, delimitando a luz, no qual esta simboliza a verdade, o sentido da vida. O ambiente é escuro, lembra uma sala de um grande líder” – Raphael Castejon

Após o clipe de “Domadores”, quais serão os próximos trabalhos em vídeo? Há alguma chance de soltar um vídeo ao vivo do show de lançamento na Clash Club (SP), quando tocaram com John Wayne, Black Days e Under the Weather?
Castejon: Sim, sem dúvida, ainda este mês será lançado um novo videoclipe, gravado pela Loud Factory no nosso show de lançamento na Clash Club, em São Paulo.

Por falar neste show na Clash Club, acreditam que a saída das bandas é se unirem e organizarem eventos para criar um público? Acreditam que o ‘modus operandi’ de enviar material e esperar convite de casas de show, bares e de produtores não está mais surtindo tanto efeito?
Castejon: Um lance que sempre conversamos é como sentimos que as produções de eventos diminuíram, talvez um reflexo da crise e do desemprego, o fã opta por investir em outra coisa do que gastar num evento de música autoral. Vivemos uma realidade complicada. Creio que a saída seja trabalhar firme, se aproximar dos fãs, se importar com cada um deles, trazer ideias novas e divulgar cada evento como se fosse o único.

Alex Gizzi | Foto: Jéssica Alves

São dez anos de pura dedicação e amor pelo que fazemos. Foram três álbuns de estúdio, conhecemos muitas pessoas durante essa caminhada e temos fãs incríveis!” – Alex Gizzi

Você citou a faixa “Réus”, que conta produtor e rapper Dr. Caligari (Dj Caíque), mas como se deu a parceria com ele e o rapper Patrick Horla no clipe do single “Emboscada”?
Gizzi: Conheço o Dj Caíque já tem um bom tempo. No ano passado, ele me ligou e falou sobre essa parceria com o Horla para a música “Emboscada” e perguntou se eu poderia gravar as guitarras e se o Castejon faria o refrão. Topamos na hora! Foi incrível trabalhar com ele e até hoje gravo algumas linhas de guitarras pra ele colocar nos Rap que produz. A participação dele no nosso disco foi consequência. Ele é um cara que respira música e curte muito metal!

Qual o saldo destes dez anos de banda? Acreditam que o nome Trayce está inserido na história do som pesado brasileiro ou ainda precisam trabalhar bastante para obter reconhecimento e acolhida do público?
Gizzi: São dez anos de pura dedicação e amor pelo que fazemos. Foram três álbuns de estúdio, conhecemos muitas pessoas durante essa caminhada e temos fãs incríveis! Aos poucos estamos construindo nossa história! E continuaremos trabalhando muito para propagarmos a nossa mensagem. Em tempos tão difíceis nós queremos ajudar as pessoas de alguma forma, seja com a reflexão que buscamos passar com as nossas letras ou com a diversão que sempre rola em nossos shows. Por fim, agradecemos de coração a oportunidade de podermos falar um pouco sobre a nossa música. Valeu, ROCKARAMA, tamo junto!

Trayce: Alex Gizzi, Rafa P.Ciano, Raphael Castejon, Fabricio Modesto e Cadu Gomes | Foto: Filipe Nevares
Trayce: Alex Gizzi, Rafa P.Ciano, Raphael Castejon, Fabricio Modesto e Cadu Gomes | Fotos: Filipe Nevares

Videoclipe de “Domadores”, faixa de “Miragem” (2017)

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