Ellis, o autor de quadrinhos e livros mais fascinante da atualidade
Um serial killer comete seus assassinatos utilizando armas de crimes icônicos como uma forma de reprogramar o código informacional que controla a civilização moderna de Manhattan. Uma corrida armamentista entre nações usa ciência avançada para transformar os deuses de seu passado em armas modernas. Um cabal dos maiores intelectos do planeta desfia o tecido da realidade ao injetar uma inteligência artificial fundida com magia celta na internet. Se este parágrafo parece algo que seria encontrado rabiscado nas paredes do ambiente onde um esquizofrênico sussurrou suas últimas palavras antes de cometer suicídio, é porque estamos falando de Warren Ellis.
Amaldiçoado a constantemente informar ao mundo que ele não é o músico do Nick Cave and the Bad Seeds, Warren Ellis é possivelmente o autor de quadrinhos e livros mais fascinante da atualidade. Alan Moore pode ter transformado HQs em arte séria, Grant Morrison pode ter explorado os limites da narrativa e Neil Gaiman trouxe uma credibilidade literária ao meio, mas somente Ellis teve a capacidade de trazer um futurismo ao mesmo tempo palpável e fantasioso, simultaneamente realista e aterrador.
Descrever e analisar o todo de sua obra seria uma tarefa herculeana e este humilde autor entende que você tem mais o que fazer. Portanto, deixo aqui algumas obras que ilustram a visão fascinante que Ellis reserva para o futuro:
4. Transmetropolitan
Em 1997 Ellis criou a saga de Spider Jerusalem. Em um futuro onde datas se tornaram irrelevante, o rabugento jornalista caminha pelas ruas da Cidade e tenta fazer sentido de um mundo que há muito tempo se perdeu para o consumerismo extremo e a única prioridade é o hendonismo. Nenhuma experiência é tabu e nenhum comportamento é restrito. O passado é um conceito esquecido e o futuro não importa, os habitantes deste mundo apenas se importam com o presente.
É neste universo que Spider se vê perante uma eleição presidencial onde é impossível determinar qual candidato consegue ser o pior e como estes monstros exploram a percepção puramente emocional e sintética das pessoas para manipular a população e atingir fins nefastos. Qualquer semelhança com a realidade dos dias de hoje é mera coincidência.
3. Frequência Global
Em 2002, quando o smartphone ainda era um sonho distante e boa parte do mundo estava começando a entender o que eram redes sociais, Ellis criou a história de uma agência de resgates que conectava diversos especialistas pelo mundo por meio de celulares avançados. E estes também funcionavam como computadores de campo.
Na época em que o Orkut ainda engatinhava, o autor já estudava o impacto de crowdsourcing no futuro próximo. Mais que isso, de como o conceito de aldeia global poderia ser utilizado para tornar o mundo um lugar melhor. Os agentes da Frequência Global enfrentam problemas que vão do realista ao absurdo, mas sempre dando ênfase à importância do livre compartilhamento da informação.
2. The Authority
É frequente encontrar o leitor de quadrinhos que julga suas opiniões como “revolucionárias”. Entre as mais batidas está a cansada análise sobre o suposto fascismo de personagens como o Batman. Mesmo sendo um debate que havia perdido o fôlego nos anos 80. Ellis criou em 1999 o The Authority.
A ideia é simples: o que aconteceria se um grupo ultra-poderoso a la Liga da Justiça decidisse que para de fato tornar o mundo melhor, seria necessário ignorar os interesses gananciosos dos governos e elites do mundo e tomar controle do mundo?
É uma ideia fascinante e o autor não abre mão de apresentar os riscos inerentes de um grupo poderoso, porém bem-intencionado, no papel de juiz, júri e carrasco do planeta. Autores subsequentes explorariam as consequências do Authority no mundo, mas nenhum com o cinismo de um velho anarquista cansado do que vê no noticiário como Warren Ellis.
1. Injection
Uma das obras mais recentes do autor. Injection conta a história de um grupo de indivíduos altamente inteligentes reunidos pelo governo britânico para determinar o futuro da cultura humana. Usando a teoria que devido às superstições, crenças e mitologia, toda a informação transmitida de uma geração para a próxima é cíclica, o grupo cria uma inteligência artificial que mistura tecnologia com xamanismo místico. A entidade começa a distorcer a realidade do mundo em uma tentativa de determinar seu propósito.
Na obra, o autor desafia sua própria crendice. Existe uma ode à inteligência humana em seu trabalho e em Injection, ele mostra que o extremo do conhecimento pode trazer a arrogância, e com ela, o desastre.
Além destas quatro recomendações, existem diversas outras obras do autor que pretendo apresentar futuramente.
Warren Ellis é capaz de tecer tramas que parecem devaneios de um sonhador perturbado que ao ver comportamentos e tecnologias do presente, imagina a pior visão imaginável para o futuro da humanidade. Por um instante, parece apenas um pesadelo, até o mundo aos poucos revelar que realidade e ficção não estão tão distantes.
Até a próxima!