Nem sempre o que se ouve ou lê sobre um artista é o que, de fato, aconteceu…
Certa vez alguém disse que a primeira vítima da História é a verdade. De fato. Ela nunca aparece de imediato e por si mesma e, por esta razão, ficamos sempre sem saber o que realmente aconteceu. Na história da humanidade, a Justiça baseia-se no testemunho e hoje sabemos que, por vários motivos, poucos testemunhos foram confiáveis. Quando a testemunha está comprometida com os fatos acontecidos, só revela em sua versão o que deseja que os outros saibam e não cita o que considera prejudicial a si ou a quem deseja preservar.
Nas artes isto também ocorre. No ambiente musical posso contar muitas histórias com conhecimento de causa. É muito comum encontrarmos várias versões sobre um mesmo fato. Dizem que, dos Beatles, existem mais de 10 biografias. Eu conheço três e cada uma contando à sua maneira, as mesmas histórias, e, algumas, até se tornaram verdades. E veja que, dos Beatles, dois dos músicos ainda estão vivos e, nem por isto, puderam evitar que falsas histórias alimentassem o imaginário popular desde os anos de 1964.
Afinal, por que no Brasil não existe a tradição de se registrar os fatos em nenhum de seus aspectos político ou social? Isto facilita o surgimento e manutenção de boatos e falsas histórias que circulam incólumes nos livros das escolas e fazem a alegria de jornais, revistas e programas populares de televisão. Intencionalmente, quase não se dá valor algum aos fatos como eles ocorreram na realidade e por quê? Ainda hoje se alguém quiser saber um pouco mais sobre algum artista brasileiro de importância, é melhor pesquisar e consultar arquivos principalmente nos Estados Unidos e na Europa.
Como produtor musical, trabalhei com mais de 130 artistas. Durante os meses de preparação e finalização de uma produção musical, muitas coisas acontecem, e, neste caso, ninguém melhor do que o produtor pra contar sobre o que houve durante o período de trabalho com relação aos estúdios, músicos e aos artistas produzidos.
No entanto, quem sabe das histórias do meio artístico não é procurado para falar sobre o assunto. Talvez pudesse escrevê-las e contá-las, mas eu não saberia dizer se vale a pena fazê-lo. Na maioria das vezes são os artistas que aos seus biógrafos e nas entrevistas, contam suas histórias e relatam fatos de suas vidas. Dificilmente ou quase nunca, revelam a verdade de um acontecimento pessoal ou artístico. Medo, insegurança, egoísmo, vaidade, são alguns dos fatores que levam à omissão da informação, a manipulação e a preferência nas falsas versões criadas em detrimento das verdades.
Diferente dos dias de hoje, nos anos 1960 as informações sobre gravações musicais eram raras, contraditórias, difíceis de obter e não havia por aqui revistas especializadas no assunto. O pouco que era publicado sobre tecnologia de áudio era a base em que os profissionais autodidatas tentavam aplicar no estúdio. Ninguém revelava descobertas técnicas a ninguém, pois o know-how era adquirido na pratica e muitas coisas aconteciam por acaso.
Sir George Martin revelou em seu livro “Sgt.Pepper”, que aprendeu usar os compressores com técnicos americanos. Pra isso teve que ir aos EUA pedir ajuda. Com dicas como esta, foi possível àquela época, gravar e mixar esta obra prima do pop, num equipamento simplório (vide foto abaixo) com míseros quatro canais de gravação.
Posso afirmar com total segurança que mesmo nos chamados livros e filmes biográficos não podemos confiar cem por cento. Digo isto porque, tudo que participei ou fui testemunha em 40 anos como profissional, nunca foi revelado na íntegra e sem uma conveniente omissão de algumas informações verdadeiras.
Hoje em dia o Auto Tune, quando bem aplicado, quase que garante que qualquer um seja artista. O que será que dirão os biógrafos do futuro, pois jamais saberão explicar a utilização desta tecnologia que permite ao produtor musical, muitas vezes transformar a arte medíocre, em um produto de sucesso.