Sucesso absoluto da Netflix mantém o enredo, mas amplia a trama e desenvolve protagonistas e novos personagens

Stranger Things 2

A segunda temporada da série Stranger Things, ou “Stranger Things 2“, foi um dos eventos mais aguardados deste segundo semestre. Trailers em momentos estratégicos, pôsteres feitos em homenagem a filmes clássicos e muitas pistas aqui e acolá, até que, finalmente, em 27 de outubro, nove novos episódios foram disponibilizados pela Netflix. A espera acabou.

Neste artigo, tentarei ficar ao máximo longe dos spoilers, mas, de qualquer forma, é sempre aconselhável assistir antes de ler qualquer coisa a respeito, tanto para não criar expectativas quanto para não estragar surpresas. Já adianto: gostei, e muito, tanto da continuação dada pelos Duffer Brothers, os irmãos Matt e Ross Duffer, criadores da série, quanto dos aspectos gerais como os novos personagens inseridos e as toneladas de referências dos anos 80, que se tornaram marcas registradas.

Por mais que a Netflix e todos os envolvidos na produção tivessem plena ideia do que tinham em mãos, a repercussão da primeira temporada ultrapassou qualquer estimativa e fez com que Stranger Things se tornassem uma das séries mais populares de 2016. A continuação gerou imensa responsabilidade e pressão. O que poderia ir além de Demogorgon e o Mundo Invertido? Qual seria o futuro de Eleven (Millie Bobby Brown) e Will (Noah Schnapp), que deixaram ganchos abertos, e as demais crianças? O que poderia ir além?

Dustin, Mike, Lucas e Will fantasiados para o Halloween
Dustin, Mike, Lucas e Will fantasiados para o Halloween

Novos personagens

Os eventos da segunda temporada de Stranger Things se passam quase um ano depois dos eventos da primeira, com Will Byers sofrendo consequências do período que esteve no mundo invertido e Eleven desaparecida. Logo no primeiro episódio da nova leva, “Madmax”, já somos apresentados a boa parte dos novos personagens, enquanto os antigos se desenvolvem aos poucos.

Entre as novidades, temos Maxine Mayfield (“Max”, interpretada por Sadie Sink), uma garota misteriosa que chama a atenção de Mike Wheeler (Finn Wolfhard), Dustin Henderson (Gaten Matarazzo), Lucas Sinclair (Caleb McLaughlin) e Will, inicialmente pelas habilidades no árcade. Já Billy Hargrove (Dacre Montgomery), meio-irmão de Max, é o novo ‘badass’ da escola, no melhor estilo Rob Lowe nos anos 1980 (até mesmo a semelhança física parece ser intencional), e antagonista direto de Steve Harrington (Joe Keery). Kali (Linnea Berthelsen) é a misteriosa integrante de um grupo criminoso que possui poderes psíquicos de ilusão e uma tatuagem 008 no pulso. Sam Owens (Paul Reiser), cientista e executivo, substituiu Martin Brenner (Matthew Modine) no Laboratório de Hawkins. Murray Bauman (Brett Gelman) é um ex-jornalista que está na cidade investigando o desaparecimento/morte de Barb (Shannon Purser). Bob Newby, um antigo nerd que hoje possui uma boa situação financeira e começou a namorar com Joyce Byers (Winona Ryder), que é interpretado por Sean Astin, famoso pelos papéis de Mikey Walsh (um dos protagonistas de “Os Goonies”, clássico de 1985 e influência direta na série) e Samwise Gamgee, o simpático e companheiro hobbit da trilogia de “O Senhor dos Anéis”, que possui muitos traços do novo). Existem outros fora do novo cast principal, mas a maioria com participação bem curta e pontual para integrar enredo. Destes, destaques para Claudia Henderson (Catherine Curtin), mãe de Dustin, e Erica Sinclair (Priah Ferguson), irmã mais nova de Lucas.

Penso que os novos personagens, exceto pela constante presença de Max, poderiam ser ainda mais aproveitados nesta nova temporada, principalmente Bob, que com o brilhantismo de Sean Astin agregou muita simpatia aos episódios. Além dele, Murray, com a interpretação fantástica de Gelman à la Richard Dreyfuss (de “Tubarão”, 1975), e Kali, que logo de início escancarou um ponto de interrogação, desenvolvido no sétimo episódio. Provavelmente, ela se fará mais presente na próxima temporada.

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Referências, referências e mais referências

As referências a filmes e obras dos anos 80 foram excelentes nos novos episódios, muito notórias e escancaradas em títulos como “Os Caça-Fantasmas” (1984) e “Aliens, O Resgate” (1986). No quesito “criaturas”, nos sentimos em casa com “Gremlins” (1984), “A Hora das Criaturas” (1986), ” E.T. – O Extraterrestre” (1982) e “O Ataque dos Vermes Malditos” (1990), enquanto os dramas dos jovens novamente remetem a situações, ou simples referências aqui e ali, como as de “Conta comigo” (1986), “Clube dos Cinco” (1985), “Mulher nota 1000” (1985) e “Karate Kid – A Hora da Verdade” (1984). Mas a coisa não para por aí: no quesito horror temos flertes com clássicos anteriores aos anos 80, com “O Exorcista” (1973), “A Profecia” (1976), “O Bebê de Rosemary” (1968), “It” (1990) e “O Iluminado” (1980).

Existem outras além de todas essas? Com certeza, mas listei as que mais me chamaram a atenção na primeira rodada de maratona. Fato é que, caçar referências enquanto assiste a série se tornou uma experiência cada vez mais divertida.

Mind Flayer, o novo vilão

Para o grande vilão da temporada os autores quiseram algo muito “maior”, “mais forte” e “mais diabólico” que Demogorgon e até criaram uma nova analogia com o Dungeons & Dragons o batizando como Mind Flayer, nome mais comum para Illithid, após um inicial “Monstro das Sombras”. E sim, ele é maior, mais forte e pior, mas, em contrapartida, se tornou um ponto de certa forma fraco, gerando menos impacto e tensão que o Demogorgon (mesmo com o retorno de variações do dito cujo). Senti que o vilão sobrenatural teve muito menos relevância dessa vez, apesar de ser um ponto chave de toda a problemática, e acabou por dar espaço para o desenvolvimento dos personagens de Hopkins.

Porém, o visual de Mind Flayer é fantástico. Quando ele apareceu pela primeira vez, me remeteu a um dos filmes que marcaram a minha infância: “A Invasão das Aranhas Gigantes” (“The Giant Spider Invasion”), de 1975, que mostrava muitas cenas de aracnídeos imensos no horizonte. Propositalmente ou não – imagino que sim -, causou um impacto similar, só que décadas mais tarde.

Mind Flayer, o "Monstro das Sombras"
Mind Flayer, o "Monstro das Sombras"

O famigerado episódio 7

O episódio mais “polêmico”, assim digamos, da atual temporada é o sétimo, “The Lost Sister“, no qual Eleven ruma para Chicago ao encontro de Kali. Ele é, sim, um ponto fora da curva e quebra o enredo da trama com o propósito de revelar muito sobre quem de fato é a 008 e o quanto isso pode ser importante para desvendar o passado da protagonista e abrir caminho para o futuro, nos capítulos seguintes.

Vi algumas pessoas reclamando sobre ele, mas, particularmente, achei genial e essencial para o que os autores propuseram para a trama. Não quero falar muito a respeito para não estragar a surpresa de quem ainda não tenha assistido, mas até as influências mudam ali.

Ambientado numa grande cidade, se adapta no enredo e mescla referências que misturam “Star Wars: O Império Contra-Ataca” (1980), “Os Selvagens da Noite” (1979), “Jurassic Park: Parque dos Dinossauros” (1993) e “Os Garotos Perdidos” (1987). Pode soar absurdo como esses filmes poderiam influenciar apenas um episódio, mas, acredite, acontece e com uma fluência muito interessante. E isso é o mais legal de Stranger Things: quem conhece os filmes que são referências na série, ou em um episódio, se divertem com isso; quem não faz ideia do que elas sejam, curtem uma trama e isso não afeta em nada o entretenimento.

Novo visual de Eleven no episódio 7
Novo visual de Eleven no episódio 7

E as músicas?

Ah, as músicas! Nesse quesito creio que a nova temporada tenha brilhado ainda mais que a primeira. Temas de filmes como ‘Ghostbusters’ (1984), de Ray Parker Jr., ‘Scarface (Push it to the Limit)’ (1983), de Paul Engemann, e ‘The Bank Robbery’ (1981), de John Carpenter para “Fuga de Nova York”, entre outros, caminham ao lado de clássicos do quilate de ‘Thriller’ (Michael Jackson, 1983), ‘Every Breath You Take’ (The Police, 1983), ‘Rock You Like a Hurricane’ (Scorpions, 1984), ‘Girls On Film’ (Duran Duran, 1981), ‘Green Green Grass of Home’ (Bobby Bare, 1965), ‘Hammer to Fall’ (Queen, 1984), ‘Runaway’ (Bon Jovi, 1983), ‘Time After Time’ (Cindy Lauper, 1984), ‘I Do Believe (I Fell In Love)’ (Donna Summer, 1983), ‘Just Another Day’ (Oingo Boingo, 1985), além de vários outros.

Percebeu uma veia mais hard rock e heavy metal na lista acima? Tem mais, muito mais, e a razão disso é que várias foram usadas exclusivamente nas aparições de Billy Hargrove, seja ouvindo no toca-fitas do carro ou fazendo musculação. Os “desajustados” gostavam de rock nos anos 80, certo? Pois bem, e a produção não poupou munição, acertando em cheio com ‘Round And Round’ (Ratt, 1984), ‘Shout at the Devil’ (Mötley Crüe, 1983), ‘Wango Tango’ (Ted Nugent, 1980), ‘The Four Horsemen’ (Metallica, 1983) e ‘Metal Sport’ (Hittman, 1985 – me surpreendeu e mostra que quem escolheu entende do assunto!). Muitas dessas músicas, inclusive, já foram usadas em filmes ao longo das últimas décadas.

E não podemos também deixar de mencionar as composições de Kyle Dixon e Michael Stein, que novamente foram perfeitas para as mais variadas ambiências, casando com o enredo é época em questão. A música em Stranger Things é um desfrute à parte para quem aprecia os anos 80.

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O futuro

Em comparação com o encerramento da primeira temporada, a nova deixou ganchos em aberto, porém com mais questões respondidas. A impressão que fica é que Matt e Ross Duffer quiseram deixar o terreno aberto para o futuro, podendo trabalhar o enredo sem compromissos estabelecidos. E é muito interessante pensarmos no que eles podem estar planejando daqui pra frente, pois tem muita coisa legal para ser desenvolvida em cada personagem e no relacionamento entre eles, o que pode ser genial, mas em contrapartida é uma linha tênue para a expectativa dos fãs mais sensíveis.

Em termos gerais, considero “Stranger Things 2” uma experiência um pouco diferente, mas tão boa quanto a que tivemos na primeira temporada. Os protagonistas foram excelentes, tanto os jovens quanto os adultos com foco em Joyce Byers e Jim Hopper (David Harbour), assim como os novos personagens agregaram bastante. Os vilões sobrenaturais foram menos intensos, em contrapartida a história geral e tramas individuais ganharam força.

Imagino que os atuais episódios não serão tão impactantes para o público quanto os da primeira leva e que a febre e frenesi relacionados à série baixem um pouco, curva essa até previsível e dentro de um padrão. Fato é que a terceira temporada será muito importante para definir a longevidade de Stranger Things. Que tenha vida longa.

Joyce Byers e Jim Hopper
Joyce Byers e Jim Hopper
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